quinta-feira, novembro 18, 2010

EXISTEM EFEITOS HISTERÉTICOS NAS IMPORTAÇÕES BRASILEIRAS?

A sustentabilidade de superávits comerciais e o potencial déficit em conta corrente voltam ao centro do debate econômico na conjuntura atual de valorização da taxa de câmbio e retomada da demanda interna.As exportações e importações brasileiras totalizaram em outubro, respectivamente, US$ 18,381 bilhões e US$ 16,527 bilhões segundo dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Entretanto, a trajetória do saldo comercial é claramente declinante já que no acumulado do ano até outubro de 2010 o saldo comercial brasileiro totalizou US$ 14.627 bilhões enquanto que em 2009, para o mesmo período, o valor acumulado era de US$ 22.495 bilhões. Ou seja, um decréscimo de 35%, que implica em um agravamento dos déficits de transações correntes.

Pelo lado das importações, destacam-se nas explicações sobre seu aumento recente os diversos componentes que aumentam a demanda interna por produtos importados, como o aumento do consumo (estimulado pela queda da relação câmbio-salário) e aumento do investimento produtivo. Conjugado a esses fatores está a tendência de valorização cambial, que se verifica de modo sistemático desde 2003, sofrendo apenas um arrefecimento durante a crise financeira ao final de 2008, fazendo com que seja retomado o questionamento sobre o nível adequado para a taxa de câmbio, bem como sobre a forma de resposta dos componentes da balança comercial às variações cambiais.

O que se observou na experiência recente brasileira é a existência de uma relação defasada e assimétrica entre taxa de câmbio e balança comercial. Por relação assimétrica entende-se que os impactos de uma desvalorização cambial podem não ser os mesmos, nem no curto, nem no longo prazo, daqueles gerados por uma valorização cambial da mesma medida. Teoricamente, essas evidências remontam à teoria de histerese para o comércio internacional elaborada inicialmente por Baldwin (1988), Dixit (1989) e Krugman (1989).


Segundo essa abordagem teórica, em razão da existência de custos de entrada e saída, os exportadores (nacionais ou estrangeiros) não entram ou saem do mercado externo prontamente em resposta às mudanças na taxa de câmbio real. Preferem adotar estratégias de “esperar e ver” para tomar decisões que devem implicar custos de saída ou reentrada, fazendo com que valorizações ou desvalorizações não gerem um efeito imediato e simétrico sobre as exportações/ importações. Sendo assim, uma questão de interesse seria saber qual o impacto da atual valorização cambial sobre importações. Ou seja, de modo mais específico, quanto se deve atribuir à valorização cambial a responsabilidade pelo aumento recente das importações? Dado que é possível classificar a relação entre a taxa de câmbio e as importações como histerética, isto deve implicar em uma relação não-linear entre câmbio e importações?

A relação entre câmbio e importações deve ser analisada decompondo-se o impacto das variações nos preços das importações e posteriormente, o efeito das variações de preços sobre os volumes demandados. Sob a ótica do repasse cambial aos preços (pass-through na linguagem da literatura econômica) a hipótese de histerese prediz que variações cambiais seriam, em última instância, responsáveis por mudanças na elasticidade-preço da demanda, determinante da margem bruta de lucro aplicada à determinação dos preços em mercados concorrenciais imperfeitos e da demanda por importações propriamente dita.
 
 
 
Uma forma de se testar a presença de histerese nas funções de demanda estimadas seria através de uma variável transformada para captar tais efeitos (Piscitelli (2000))3. Os resultados econométricos obtidos por Prince e Kannebley (2010) sugerem que a hipótese de histerese foi aceita para a equação de formação de preços em dezessete, dos vinte e nove setores, o que corresponde a 68% das importações no período4. Foi observado o que ajuste da elasticidade da relação ocorre majoritariamente em setores com elevados custos irrecuperáveis, como os intensivos em engenharia e tecnologia, ou em escala, estando em concordância com a predição teórica para existência de histerese baseada na existência de custos irrecuperáveis.

No que tange à demanda por importações, a verificação da hipótese de histerese ocorreu para treze setores industriais, corresponde a 48% das importações no período, sendo também a maior parte deles intensivos em engenharia e tecnologia, ou em escala. Também foi observado nas estimações das equações de demanda.


Uma elevação das elasticidades da taxa de câmbio da demanda quando corrigidas para a existência de histerese, representando a demanda como elástica para a taxa de câmbio.

Testes adicionais para o agregado das importações, realizado pelos mesmos autores, sugerem que o preço das importações, em moeda estrangeira, responde apenas aos momentos de desvalorização cambial, ou então à redução de custo em moeda estrangeira. Sendo assim, no período corrente em que se verifica forte valorização cambial, isto deve significar efetivamente uma manutenção dos preços em moeda estrangeira dos bens importados, a despeito do aumento do preço dos bens produzidos domesticamente quando cotados em moeda estrangeira. Sendo assim, ainda que o exportador para o mercado brasileiro pudesse aproveitar para elevar seus preços e aumentar sua margem de lucro, parece preferir estratégias de precificação que favoreçam a ampliação de suas parcelas de mercado, mantendo inalterados os preços em moeda estrangeira.

Já nos momentos de desvalorização cambial, ou de redução de custos, os exportadores estrangeiros para o Brasil repassam esses efeitos para o preço dos produtos importados, reduzindo seus valores em moeda estrangeira, evitando, conseqüentemente, um movimento maior de desvalorização da taxa de câmbio real. O efeito dessa política de formação de preços se traduz em um comportamento da demanda que tende a perpetuar a presença do produto importado no mercado brasileiro, o que seria responsável pelo efeito histerético nas importações.

 


 


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