terça-feira, maio 01, 2012

Os Superadvogados brasileiros!

  
Os Superadvogados brasileiros!

Excesso de causas na Justiça e honorários milionários fazem do direito a carreira mais promissora do momento

Nunca os advogados tiveram tanto serviço e ganharam tanto dinheiro. Faça as contas: Priscila Corrêa da Fonseca, de São Paulo, é especialista em direito de família, recebe seis novos casos de divórcio diariamente e cobra entre 10.000 e 30.000 por um serviço desses. Mantendo tal ritmo, seu escritório pode receber 100.000 reais por dia, ou algo como 2,5 milhões de reais por mês. O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, de Brasília, não atende ninguém por menos de 75.000 reais. A não ser alguns poucos amigos. Contratado há quinze dias pelo banqueiro Salvatore Cacciola, do Banco Marka, o escritório de Almeida Castro tem dezenas de ações tramitando nos tribunais superiores. Especializado em direito internacional e comercial, o advogado paulista Hermes Marcelo Huck costuma receber pelos seus serviços por hora: cobra 550 reais de quem se interessar. Se trabalhar oito horas por dia e cinco dias por semana, pode ganhar quase 90.000 reais por mês, fora honorários a que tem direito quando vence uma ação.
Esses profissionais são alguns integrantes de um grupo cada vez maior de superadvogados. Gente que oferece atendimento e desempenho de primeira. Em troca, cobra pesado. O país já teve a fase dos engenheiros bem-sucedidos, principalmente na década de 70, tempo de Brasil grande. Viveu em seguida a fase da fartura no mercado financeiro, que pagava bonificações milionárias até outro dia. Está agora atravessando a fase dos superadvogados. Nos dias de hoje poucas profissões exibem possibilidade de ascensão tão espetacular quanto o direito. O começo de carreira é um tédio.
O jovem bacharel tem de redigir petições, ir ao fórum tirar xerox de processos e buscar jurisprudências, algo como um contínuo de luxo. Vencida a decepção inicial, a profissão promete. Basta ver o ganho dos profissionais mais graduados. "Os advogados estão vivendo uma fase de ouro", afirma o advogado Márcio Thomaz Bastos, um peso pesado do direito criminal. Ele próprio não entra numa causa por menos de 50.000 reais. "Você pode nunca precisar de um arquiteto ou de um engenheiro. É só não querer construir uma casa. Mas advogado não é querer, é precisar", diz Priscila Corrêa da Fonseca. Seu escritório tem hoje um estoque de 400 causas de separação litigiosa em andamento. Os clientes são jogadores de futebol, cantores, empresários, presidentes de empresas. "Sucesso não vem de graça. Fiz muito esforço, sacrifiquei minha vida pessoal, mas acho que valeu a pena", afirma. Sem filhos, solteira e trabalhando catorze horas por dia, Priscila é hoje dona de um dos cinco escritórios mais movimentados do país nessa área. "Muda a moeda, o presidente, mas sempre haverá gente se separando e brigando na partilha de bens", afirma. Com a advocacia comprou uma cobertura de 900 metros quadrados, uma casa paradisíaca na praia e uma adega com garrafas que chegam a custar 5.000 reais cada. Seu patrimônio é estimado em alguns milhões de reais. "Não sou rica, mas vivo bem." Para espairecer, quatro vezes por ano a advogada embarca para Nova York numa quarta-feira, assiste a óperas todas as noites, janta em restaurantes em que a conta nunca é menor que 250 reais por pessoa e volta a São Paulo no domingo à noite.
Sofisticação no mercado

O surgimento dos superadvogados ocorre num momento em que a profissão no Brasil está passando por uma transformação interessante. Antigamente, os bons escritórios pertenciam a nomões tradicionais e praticamente acabavam após a morte do dono. Essa gente sempre ganhou bem, e os remanescentes continuam a fazer sucesso, como é o caso do escritório do jurista José Luiz Bulhões Pedreira, do Rio de Janeiro. Hoje, há alguns escritórios estrangeiros na lista das melhores bancas brasileiras: Baker & Mackenzie, Clifford Chance, Linklaters & Alliance e White & Case. Trouxeram consigo oportunidades de emprego para jovens, salários acima da média e novos métodos de trabalho. Há outras mudanças perceptíveis. Os advogados sempre foram muito bairristas.

O criminalista carioca não pegava casos em São Paulo, e o tributarista gaúcho não buscava clientes na Bahia. Não é mais assim. Entre os maiores nomes da advocacia, boa parte criou filiais fora de seus Estados. Outra fatia montou estruturas de representação em algumas capitais, como se fossem franquias. Até pouco tempo atrás, o direito pagava salários equivalentes a duas outras profissões igualmente tradicionais: medicina e engenharia. Atualmente, advogados têm um rendimento médio até três vezes maior do que médicos e engenheiros.

A razão de tanta mudança é de uma simplicidade irritante: viver está mais complicado. Como a preocupação ecológica é cada vez maior, surgiu uma especialidade do direito ligada à legislação ambiental. Com o código do consumidor, desenvolveu-se um setor de trabalho ligado especificamente a essa lei. Com a abertura de mercado, cresceu uma demanda por especialistas em direito comercial e societário. E com as privatizações e a globalização ganharam força os especialistas em telecomunicações e em direito internacional. Nas transações com o exterior, as empresas costumam eleger tribunais de Nova York ou Londres para resolver eventuais disputas. Na hora de negociar, o advogado tem de conhecer as leis desses locais. Por trás de cada dólar que entra no país, há um aparato judicial que vai nortear contratos e transações econômicas. Isso sem falar nas novidades surgidas nos segmentos tradicionais do direito. O ramo trabalhista não é mais o mesmo depois de alguns acordos assinados entre patrões e empregados prevendo redução de salário, programas de demissão voluntária e terceirização. O direito tributário ficou mais complexo após a guerra fiscal e o direito de família vive em mutação. A última é a lei em discussão no Congresso sobre a união civil estável de homossexuais, o chamado casamento gay.

Já não há vagas nos grandes escritórios para advogados com formação genérica, como direito comercial apenas. Quem quiser um lugar ao sol terá de estudar mais. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Reginaldo Oscar de Castro, acha que atingir essa qualificação é algo mais complexo do que parece em função das limitações do atual sistema de ensino. "O Brasil tem quase o dobro de cursos de direito que os Estados Unidos. Não faz o menor sentido. Virou um negócio para os empresários do ensino", afirma. Todos os anos, 260 faculdades despejam no mercado cerca de 30.000 novos bacharéis. Como há 250.000 advogados em atividade no país, quem quer um destaque precisa acordar mais cedo, ler o que puder, estudar mais e trilhar um caminho diferente dos demais.

Foi o que fez Roberto Trigueiro Fontes, 35 anos. Ao perceber a mudança em curso, abriu filiais de seu escritório do Recife em Natal, Salvador e Fortaleza. É um dos maiores do Nordeste, com 67 pessoas. Conseguiu reunir clientes como Esso, Renault e Antarctica. A especialidade é direito comercial. "As pessoas daqui tinham de ir a São Paulo ou ao Rio atrás de advogados. O Nordeste é um mercado imenso, ainda mais depois da chegada das multinacionais", afirma. Trigueiro costuma cobrar de honorários o equivalente a até 2% do valor de uma causa ou 140 reais por hora de trabalho. Defende a Esso em uma ação avaliada em 3,5 milhões de reais por má-fé de postos de gasolina que quebraram contratos com a empresa. "Um cliente bom puxa outro. Descobri uma oportunidade que foi a de assessorar as empresas num lugar onde não havia ninguém especializado", relata.

Outra lição de perseverança vem do Espírito Santo. O advogado Sérgio Carlos de Souza queria associar-se a um grande escritório brasileiro para alavancar sua banca local. Durante quase dois anos, Souza enviou fax e cartas mensais a uma banca tradicional de São Paulo, Pinheiro Neto. Após dezenas de negativas, o dono do escritório resolveu recebê-lo em São Paulo. Seis meses depois, como seu representante no Espírito Santo, Souza tem uma carteira de cinqüenta empresas. Uma de suas maiores causas é contra o governo estadual. Seu cliente quebrou porque ficou sem receber pagamentos devidos pelo Estado. Está processando o governo em 100 milhões de reais. Se ganhar, Souza pode embolsar 15 milhões de reais em honorários.

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