sexta-feira, março 25, 2011

As nossas urnas eletrônicas são seguras?

Há três conceitos fundamentais para entender a questão do voto eletrônico no Brasil. Estes conceitos são:
1) Não há tripartição de poderes no processo eleitoral brasileiro e, por consequência, o processo está maculado com autoritarismo e falta de transparência.
2) A confiança de muitos no sistema eleitoral  eletrônico brasileiro é confiança cega (intuitiva) e não confiança técnica estabelecida por critérios objetivos de avaliação.
3) Teoricamente não é possível construir sistemas eleitorais puramente eletrônicos (digitais, virtuais) que deem simultaneamente garantia de inviolabilidade e de correta apuração do voto.
É por isso tudo que no Brasil temos um sistema eleitoral eletrônico cujo resultado publicado não tem como ser conferido pela sociedade civil (partidos e eleitores) e que é rejeitado no resto do mundo.

Por outro lado,pela falta de conhecimento e de estudo atento do problema, é comum as pessoas resistirem a essas ideias.

Se fala muito que o sistema eleitoral eletrônico brasileiro utiliza as mais modernas técnicas de segurança (entenda-se: assinatura digital) e é modelo copiado no resto do mundo.... mas é tudo conceito equivocado.
Na realidade,:
1) o inventor da técnica de assinatura digital (Ph.D. Ronald Rivest) é um dos que mais critica o modelo brasileiro de urnas eletrônicas e do uso ERRADO que nele se faz da assinatura digital.

2) A urna-E brasileira foi rejeitada por TODOS (mais de 60) países que vieram conhecê-la. 
Em resumo, bem resumido, é isso.

Mas, para que você não precise confiar simplesmente na minha palavra, a seguir estendo um pouco essas explicações.


1) Conceito político - a importância da tripartição de poderes

Este é um conceito bem conhecido e mais fácil de compreender.
A tripartição dos poderes em Executivo, Legislativo e Judiciário visa impedir os males do poder absoluto como o autoritarismo, o corporativismo e a falta de transparência na coisa pública.

O que é muito pouco percebido é que no processo eleitoral brasileiro não existe tripartição de poderes!



O que chamamos de Justiça Eleitoral é de fato o Administrador Eleitoral que acumula funções normativas (as Resoluções e Instruções do TSE) e judiciárias. E disso decorrem inevitavelmente o autoritarismo, o corporativismo, insegurança jurídica e principalmente, a falta de transparência eleitoral.

É exatamente por isso que, nas eleições brasileiras, temos as seguintes peculiaridades:

- a sociedade (eleitores e partidos) não tem como conferir contabilmente o resultado publicado da eleição (o modelo de urna eletrônica adotado pelo TSE não propicia um meio direto e tecnicamente confiável de auditoria do resultado)

- o administrador eleitoral muda as regras eleitorais a seu exclusivo critério, às vezes no meio do jogo, as vezes sem coerência, as vezes casuisticamente, como nos casos da verticalização das coligações, do ficha-limpa, dos critérios de inelegibilidades.

propaganda institucional maciça e manipulada para induzir ideias falsas como as urnas brasileiras serem seguras e modelo para o resto do mundo (a realidade que a grande maioria dos brasileiros não esta informada é que ao modelo das urnas-e brasileiras foi rejeitado por TODOS os mais de 60 países que vieram conhece-las e são até proibidas em muitos deles)

- interferência  de poderes, com o judiciário tentando se impor ao legislativo, como no recente caso da ADIN 4543 onde mentiras deslavadas foram geradas no TSE para tentar derrubar uma lei, legitimamente aprovada, que os desagrada.

- desinformação dos partidos e público em geral pela autoridade eleitoral que recorre até a falsidade intelectual (sem temer retaliação) como no caso Relatório do Comitê Multidisciplinar do TSE entregue aos Deputados Federais.

Mas isso é só uma maneira comoda de se tentar tapar o sol com a peneira. A verdade é que no Brasil o processo eleitoral não tem nenhuma transparência, a sociedade civil não controla nem tem como conferir o resultado eleitoral, e essa situação simplesmente não é aceita na grande maioria dos países desenvolvidos e civilizados.


2) Conceito ontológico - a confiança cega e a confiança técnica

No meio acadêmico e tecnológico internacional se utiliza duas palavras em inglês distintas para se referir a:
trust - confiança tecnicamente estabelecida por critérios objetivos de avaliação
confidence - confiança cega ou intuitiva em pessoas ou processos.
Em português não temos duas palavras diferentes para esses conceitos e sempre se fala apenas"confiança" sem deixar claro se está se falando de confiança técnica ou confiança cega.

É assim com as eleições eletrônicas. Pessoas (inclusive alguns políticos do PSDB) falam que confiam no sistema eletrônico eleitoral brasileiro, mas estão falando de confiança intuitiva, cega, e não em confiança tecnicamente determinada por procedimentos objetivos de avaliação.

O que nós defendemos e procuramos é que se estabeleça critérios técnicos objetivos de conferência do resultado eleitoral eletrônico sem que seja necessário recorrer à confiança (cega) na honestidade dos programadores e operadores da autoridade eleitoral.

3) Conceito tecnológico - voto secreto, um documento não-rastreável 

No campo eleitoral, o voto secreto equivale ao papel moeda no campo financeiro: ambos são documentos que carregam informação de valor mas são irrastreáveis

Explicando:

No mundo financeiro real, tanto o papel moeda (dinheiro) como ordens de pagamento (cheques, por ex.) servem para transferir posse de valores monetários mas têm características de rastreabilidade diferentes:

- a ordem de pagamento, além do valor que transfere, contem informações sobre sua origem e destino que permitem rastrear seu caminho e até, eventualmente, desfazer transações indevidas.

- o papel moeda contem apenas a informação sobre o valor que transfere e mais nenhuma informação sobre de quem veio e para quem vai. É um documento que, por si só, não tem como ter sua origem e seu percurso determinado (rastreado) para eventualmente ser desfeito.

É exatamente por essa característica de não-rastreabilidade que, no ato corrupto, se dá preferência ao dinheiro em papel.

Quando se migra para o mundo virtual (eletrônico, digital) apenas existem ordens de pagamentos virtuais.

Não existe equivalente eletrônico ao papel moeda, isto é, um arquivo digital que transfira valores monetários mas que não possa ter sua origem rastreada.


E isso ocorre por uma simples questão de segurança e confiança (técnica): se houvesse um arquivo digital com um valor monetário determinado e formalmente aceito, bastaria se duplicar esse arquivo (copiar de um dispositivo de memória eletrônica para outro) para se duplicar o valor monetário que se possui.

Enfim, no meio virtual, não há forma técnica de se determinar a confiança (trust e nãoconfidence) em documentos irrastreáveis.

Compreender esse fato é muito importante para entender a questão do voto eletrônico.

Essa afirmação de que "não há forma técnica" que dizer que NÃO HÁ FORMA TÉCNICA MESMO, isto é,NÃO EXISTE, NÃO É POSSÍVEL criar e processar documentos puramente virtuais (digitais, eletrônicos)  não-rastreáveis de maneira tecnicamente confiável (garantida, conferível).

O voto para ser secreto tem que ser necessariamente um documento não-rastreável. 

É assim no voto em papel. A cédula eleitoral contem apenas a informação de valor (o nome candidato votado) mas não pode ter nenhuma outra informação que possa remeter a sua origem (o eleitor que votou).

Quando se migra para o campo virtual, o voto digital para atender ao princípio de inviolabilidade do vototeria que ser necessariamente um documento digital não-rastreável e, assim o VOTO SECRETO ELETRÔNICO SEMPRE SERÁ UM DOCUMENTO QUE NÃO TERÁ COMO TER SUA CONFIABILIDADE TECNICAMENTE ESTABELECIDA (conferida, auditada)



Não dá para confiar num voto secreto puramente digital assim como não dá para confiar (tecnicamente) em "dinheiro virtual".

Essa é uma condição absoluta e cientificamente incontornável e não é uma questão de domínio ou aperfeiçoamento tecnológico. Nunca será possível se construir um sistema de voto secreto virtual cuja confiabilidade possa ser tecnicamente determinada.

É muito comum os tecno-deslumbrados dizerem que se é possível fazer transação de milhões de dólares por computador então também seria possível criar sistemas eleitorais confiáveis.

Mas isso só é verdade para sistemas eleitorais onde o segredo do voto não é condição necessária e impositiva.

Em todos tais sistemas financeiros eletrônicos confiáveis, as transações são feitas com ordens de pagamento virtuais RASTREÁVEIS e não com algo que fosse equivalente a papel-moeda não-rastreável.

Assim, para sistemas eleitorais com voto secreto, simplesmente não é possível virtualizá-los com segurança, da mesma forma que não há transação financeira não-rastreável no mundo digital.

No resto do mundo, essa percepção já está sendo aos poucos incorporada ao substrato jurídico e conceitual relativo às eleições eletrônicas. 

Em 2006, o Ph.D. Ronald Rivest (também inventor da técnica de assinatura digital em 1978), justamente por compreender que a sua técnica de assinatura digital não resolvia a segurança do voto eletrônico, propôs o conceito de "Independência do Software em Sistemas Eleitorais"que consiste em registar o voto em meio material (papel, por. ex.), além do Registro Digital do Voto, para que possa ser feita uma auditoria do resultado eleitoral eletrônico sem precisar se confiar cegamente no software das máquinas de votar.



Em 2007, esse conceito de Rivest foi incorporado pela norma técnica norte-americana sobre sistemas eleitorais (VVSG) na qual o modelo brasileiro de urna eletrônica (que não atende ao conceito) simplesmente está DESCREDENCIADO.

Em 2008, o modelo da urna brasileira foi proibido na Holanda depois de mais de 15 anos de utilização (a Holanda usava urnas eletrônicas antes do Brasil).

Em 2009, o modelo da urna brasileira foi declarada inconstitucional na Alemanha porque não atende o Princípio da Publicidade (transparência) pois não permite que o próprio eleitor possa conferir o destino do seu voto.

É bom lembrar que o conceito de Registro Digital do Voto com Assinatura Digital (o voto virtual não rastreável) foi introduzido na lei brasileira pelo, então, Sen. Eduardo Azeredo (PSDB-MG) que equivocadamente insiste em dizer que ele permitiria a conferência da apuração eletrônica.

Mas, por tudo que apresentei acima, e contando com a corroboração do inventor da técnica de assinatura digital, posso dizer que a afirmação do (atual) dep. Azeredo não tem fundamentação técnica e teórica real. O Registro Digital do Voto com Assinatura Digital que ele criou não serve como base para uma auditoria tecnicamente confiável do resultado eleitoral que seja independente do software usado nas urnas.

Tudo que afirmo nessa mensagem pode ser comprovado em textos, artigos, normas técnicas e decisões judiciais escritos no exterior, mas é um conjunto muito grande de documentos (só a norma técnica VVSG tem 600 páginas).

Lembrando que o Ronald Rivest é o inventor da assinatura digital que o Azeredo apresenta como a garantia de segurança de nossas urnas,  recomendo ler primeiro o artigo (em inglês) do Ronald Rivest onde ele propõe o conceito de Independência do Software em Sistemas Eleitorais que pode ser baixado de:
  http://vote.nist.gov/SI-in-voting.pdf



O melhor texto em português sobre tudo isso é o Relatório do CMind  (105 páginas) que pode ser baixado de:
  http://www.votoseguro.org/textos/RelatorioCMind.pdf


Além da APURAÇÃO RÁPIDA DOS VOTOS, que já nos oferece,
deveria propiciar uma APURAÇÃO CONFERÍVEL PELA SOCIEDADE CIVIL

Conheça o Relatório do CMind

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